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Dicas de Vestibular

Cultura cinéfila no vestibular – um olhar enriquecido

Dicas de Vestibular

10/04/2019 14h02

* Por Eloy Gustavo de Souza, professor do Anglo Vestibulares

Algumas das questões mais difíceis dos grandes vestibulares atuais têm exigido dos alunos uma bagagem de conhecimentos que não se circunscreve àquela auferida apenas pelo estudo dos conteúdos programáticos: os conhecimentos que se espera que um aluno, ao fim do ensino médio, domine. Num mundo em que circula uma quantidade impressionante de informações variadas – que vão do Fake News manipulador até a pesquisa acadêmica passando pelo mito e pelo "besteirol" –, o que se quer dos futuros universitários é uma curiosidade e uma disciplina que os levem a consumir informações de qualidade, as quais lhes permitam entender o mundo e com ele interagir com consciência. Em outras palavras, ou empregando um termo já tão repetido, o que se quer é um repertório o mais possível refinado.

O cinema, como de resto toda mídia, é uma forma de transmissão de informações, as quais, além do valor que podem ter em si mesmas, podem ainda ensejar a reflexão, contribuindo para o alargamento e amadurecimento intelectual dos espectadores. Em se tratando de vestibular, as contribuições prestadas pelo cinema são múltiplas e podem se dar em todas as matérias. Cumpre observar, entretanto, que, mesmo sendo certo que qualquer filme, por pior que seja, pode no mínimo introduzir um raciocínio, são os clássicos e os atuais com alguma consagração crítica que comumente mais contribuição trazem. Além do valor comprovado pelo crivo do tempo ou da análise, são bastante conhecidos, facilitando, por isso, o seu comentário, já que é provável que, filme renomado, o examinador o conheça.

Neste breve texto, teceremos algumas considerações sobre o aproveitamento do cinema para a prova de História.

É praticamente uma obviedade que filmes com narrativa baseada em fatos históricos podem contribuir para as questões dessa matéria. Cabe, contudo, um alerta: para que aquilo a que se assistiu possa de fato ser útil, é preciso acrescentar ao filme uma pesquisa em fontes confiáveis. Os filmes são, sobretudo, obras de ficção e, mesmo que se pretendam fiéis aos fatos, podem trazer uma interpretação sobre eles que nem sempre é a mais consensual.

Filmes como o canadense Incêndios (Denis Villeneuve, 2010) são impactantes. O sofrimento da protagonista nos apieda, é catártico, mas o mais relevante para quem busca informações é entender o que foram aquelas tragédias políticas e sociais que tanto ódio e violência trouxeram. A Guerra Civil no Líbano, a Questão Palestina e o problema dos refugiados, a intolerância religiosa e a formação de guerrilhas, a emigração para países de tolerância e bem-estar social como o Canadá são alguns dos temas que se entrelaçam à angustiante história de mãe e de esposa. Note-se: o filme por si só não informa com clareza o que são esses eventos históricos, mas a inserção de uma história pessoal neles, numa narrativa bem feita e sedutora, dá um grande estímulo para pesquisar.

Por outro lado, filmes que tratam de eventos mais familiares para alguém podem, por vezes, reservar-lhe armadilhas. É bastante conhecido o fato de que Hitler cometeu suicídio em Berlim pouco antes da rendição da Alemanha, portanto, a liberdade poética de Tarantino ao fazer o ditador morrer em Paris (Bastardos Inglórios, 2009) dificilmente prejudicará um vestibulando bem informado.

Já outra obra-prima desse talentoso narrador, Django livre (2012), tem como um dos seus momentos de maior tensão o mandingo fight, evento que repugna por mostrar um dos aspectos mais execráveis da escravidão: o direito do senhor de expor seu escravo à violência física, incluindo a brutal. O problema é que tal luta muito provavelmente não existiu, acadêmicos consultados disseram não conhecer registros dela, e, portanto, a sua menção numa prova como um fato histórico certo será prejudicial. Também se evitam tais problemas com pesquisa. Além do estudo do período e dos eventos históricos retratados no filme, vale muito a pena ler as críticas que se escreveram sobre ele, pois, além das muitas informações trazidas, elas revelam muitas vezes os eventos da narrativa que não são verídicos ou cuja veracidade é polêmica. Boas críticas podem ser encontradas na internet, principalmente em inglês, o que já é um exercício também para a prova desse idioma.

Por fim, encerraremos lembrando que o filme histórico não dialoga apenas com a época que retrata, mas também com a em que foi feito. Isso é particularmente evidente em filmes que discorrem sobre o mesmo evento. Pensemos em Maria Stuart (John Ford, 1936) e Duas Rainhas (Josie Rourke, 2018), ambos fazem a biografia de Maria Stuart, desde a sua chegada à Escócia até a sua decapitação.

No primeiro filme, o maniqueísmo é quase sempre presente, Elizabeth I é má e invejosa, mas age com prudência e cálculo; Maria Stuart é passional e ingênua, o seu amor pelo Conde Bothwell a levará à ruína. Já na prisão, à espera de sua execução faz o elogio do amor, aceitando o sacrifício que ele impôs. No filme atual, a questão do feminismo se faz presente. Tanto a rainha inglesa quanto a escocesa sofrem, pela condição de mulher num mundo eminentemente masculino. Maria Stuart por vezes é ingênua, mas luta sempre por ter o seu destino em suas próprias mãos e lembra a todos que o trono é seu por direito, sua postura é sempre altiva. Seu casamento com Bothwell não foi por amor, forjou-se por uma intriga palaciana, associada à violência sexual, à qual sempre resiste.

Sobretudo, tenha-se em vista as duas cenas finais: a Stuart de 1936 caminha a para o patíbulo assustada, encontrando forças na oração. É a imagem da fragilidade da mulher que, se não encontrar um sustentáculo, sucumbe à vileza do mundo, ou seja, está em consonância com o que se esperava que uma mulher fosse, sua imagem desperta a piedade. A atual caminha serena, sem hesitar, e, pouco antes de baixar a cabeça ao cepo, suas aias puxam o vestido negro que a cobria, revelando um outro de cor púrpura, uma cor subversiva neste caso, pois é a cor da realeza – mesmo na morte, mostra a sua rebeldia, a sua altivez.

Com essas considerações, esperamos que o singelo ato de se assistir a um bom filme possa ser utilizado como um complemento à preparação para o vestibular. Para os que enfrentam uma rotina de estudo pesado durante o dia, que o cinema entretenha, mas também contribua para a sua aprovação.

Sobre os Autores

O Dicas de Vestibular é produzido e atualizado pelos professores do Anglo Vestibulares e do Sistema Anglo de Ensino.

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