130 anos de Lei Áurea: contexto histórico e atual da abolição
Em 2018, o povo brasileiro comemora 130 anos da abolição da escravatura. A Lei Áurea, assinada pela princesa Isabel enquanto regente do trono, em 13 de maio de 1888, decretou o fim de todas as atividades escravistas do Brasil.
Há muito o que se analisar sobre esse acontecimento. O Brasil foi o último país americano independente a abolir a escravidão, e, diferentemente do que aconteceu em outros lugares, o fim do trabalho escravo no país decorreu de um processo complexo. A história comparativa nos permite compreender com mais eficiência o fim da escravidão brasileira. No Haiti, por exemplo, a abolição da escravidão ocorreu em meio a um cenário revolucionário – a Revolução de São Domingos, caracterizada pela luta dos haitianos pela independência do país e pelo fim do trabalho compulsório. Líderes como Toussaint Louverture e Jean Jacques Dessalines conduziram o povo haitiano em busca de sua liberdade. Outro caso que merece destaque foi o dos Estados Unidos. Em meados da década de 1860, o presidente Abraham Lincoln assinou a décima terceira emenda à constituição, que decretou o fim da escravidão em território norte-americano, fato que contribuiu para uma violenta guerra civil (Guerra de Secessão). Ao final do conflito, com a vitória dos Estados do Norte, de direcionamento político liberal, o fim do trabalho escravo foi consolidado em todo o país.
No Brasil, a abolição se deu através de um processo conduzido pelo Estado, que respondia à pressão inglesa, ao movimento abolicionista e às constantes manifestações e rebeliões dos escravizados do país. É importante destacar também que o regime escravista tornava-se cada vez mais anacrônico, uma vez que a economia brasileira passava por um processo de modernização. A circulação de parte do capital oriundo das exportações do café estimulava diversas atividades nos setores produtivos e de comércio, e o escravismo era um entrave para o desenvolvimento dessas ações econômicas. No entanto, a monarquia calculava que o fim radical da escravidão no país poderia causar atritos políticos com os setores escravista e mais conservadores da sociedade. Assim, buscando amenizar tais conflitos, o Estado passou a conduzir de forma gradual o fim da escravidão brasileira.
Foram várias as ações políticas na direção da liberdade dos escravizados: a Lei Eusébio de Queirós, de 1850, reprimiu e posteriormente extinguiu o tráfico para o Brasil. A partir de então, a escravidão entrou em decadência, e o número de trabalhadores livres cresceu significativamente. O movimento abolicionista, organizado posteriormente e que agregava lideranças como André Rebouças, Luís Gama, Castro Alves, Francisco de Paula Brito, Chiquinha Gonzaga, Joaquim Nabuco, Augusta Generoso Estrella, Leonor Porto, entre outros e outras, passou a pressionar o governo, a conscientizar a sociedade sobre o tema da abolição e a ajudar escravizados em diversas questões. Nesse cenário, ocorreram importantes conquistas jurídicas como a Lei do Ventre Livre de 1871 e a Lei do Sexagenário de 1885. Em termos numéricos, essas leis não trouxeram resultado prático tão significativo, mas a possibilidade da liberdade para recém-nascidos e escravizados mais velhos trouxe um estímulo maior para a luta pela abolição.
O projeto da Lei Áurea foi formalmente apresentado ao poder legislativo por Rodrigo Augusto da Silva e debatido pelos deputados e senadores entre os dias 10 e 13 de maio de 1888. Naquele momento, o governo estava sendo conduzido pela herdeira Dona Isabel, que regia o trono enquanto seu pai, o imperador Dom Pedro II viajava. É fato que o regime monárquico brasileiro sofria severos abalos naquela década e os republicanos, cada vez mais fortes e organizados, estavam se aproximando do poder. Muitos previam que a mudança do regime monárquico para o republicano se daria logo após a morte do velho e apático imperador Dom Pedro II. Assim, a princesa Isabel se via em um labirinto político. E foi nesse cenário que a herdeira passou a articular pela aprovação da Lei Áurea. A proposta da abolição estava cada vez mais popular, e protagonizar a libertação dos cativos poderia trazer fôlego à postulante a imperatriz. Portanto, no dia 13 de maio de 1888, motivada pela crise política, por pressão dos abolicionistas, da sociedade, da Inglaterra e por questões pessoais, a princesa Isabel assinou a Lei Áurea, que decretou o fim do trabalho escravo no país.
O resultado político da Lei foi bastante ambíguo para Isabel. Se por um lado, a princesa foi ovacionada pelo povo brasileiro como a redentora do país, por outro perdeu o último apoio contundente ao regime monárquico: os escravocratas conservadores, que passaram gradativamente a apoiar o movimento republicano, que não foi enfraquecido pela abolição. Pouco mais de um ano depois, a monarquia caiu e a República foi proclamada.
Para os então antigos escravos, a liberdade batia à porta, mas junto com ela toda uma tradição de violência, preconceito racial e marginalização. Pouco foi feito para se tentar integrar os negros à sociedade. Para esse grupo social, faltavam educação, emprego, alimentos, saúde e inclusão social. A Lei Áurea marcou o fim da escravidão e o início da luta pela igualdade. Desde então, muito já se conquistou nesse quesito, mas ainda há muito o que se conquistar no que concerne à cidadania, à dignidade e ao respeito.
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