Livro, leitura, literatura
A Unesco instituiu 23 de abril como Dia do Livro. E o que se comemora efetivamente nessa data? O compositor Caetano Veloso nos dá uma pista: "Os livros são objetos transcendentes". De fato, o que se celebra é algo vai além do próprio livro: o ato de ler.
A leitura está bastante relacionada ao universo da educação. Estudar é ler. O primeiro passo da compreensão é a leitura da teoria; o início da resolução de exercícios é sempre a leitura do enunciado. Mas, ainda aqui, podemos dizer que a leitura é uma atitude que transcende o ambiente escolar. Lê-se na escola, mas não apenas ali. O mundo à nossa volta é um grande texto a ser lido. Imagens, pessoas, sinais, gestos, atitudes, posturas políticas – são textos. Recusar-se à leitura é fazer a opção por receber o mundo sem exame, sem análise, sem crítica. Na era da informação facilitada, educar é, acima de tudo, ensinar a ler o mundo.
No universo da leitura, a literatura desempenha um papel muito especial. É corrente a opinião de que a leitura literária tem o poder de oferecer uma fuga da realidade, uma forma de esquecer as preocupações do cotidiano. Pode-se dizer que esta é uma leitura equivocada da… leitura. A literatura não é fuga, mas deslocamento. Ela nos tira da nossa posição usual, e nos expõe a posturas diferentes das nossas. Quando lemos um poema, e nele encontramos a palavra eu, temos plena consciência, claro, de que se trata de um eu poético, o fingidor a que se referiu Fernando Pessoa. Mas, ao enunciarmos a simples palavra eu, é como se nos apropriássemos daquele texto, como se transformássemos aquela sensação em nossa sensação, aquela forma de perceber (e ler) o mundo em nossa forma. Isto é: nós nos deslocamos de nossa posição usual, mas não apenas não fugimos do mundo, como, ao contrário, mergulhamos mais profundamente nele.
Assim, a literatura é um exercício de percepção do outro. Por essa e outras razões, ela é cada vez mais necessária em um mundo em que a intolerância provoca a metamorfose dos indivíduos naqueles três macaquinhos que se recusam a ver, ouvir e falar – isto é, a ler e a ser lido.
Todos os anos, estudantes do Brasil inteiro são submetidos a leituras obrigatórias para o ingresso em universidades importantes. Geralmente, reagem mal a essa obrigatoriedade – e têm razão em fazê-lo -, porque essa imposição subtrai muito do essencial da leitura literária, que é o prazer de ler, o que começa pela livre escolha do que ler. Mesmo que seja imposta, é preciso encarar a leitura literária como um instrumento de inserção naquilo que o mundo tem de mais rico, a diversidade.
O exercício dessa diversidade começa pela aceitação do convite que todo livro faz: deixe-se levar por essa experiência, principalmente se for preciso vencer resistências pessoais. A leitura abre o mundo aos sentidos do leitor. E a leitura literária oferece ao leitor a oportunidade de abrir-se para todos os sentidos do mundo.
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