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Além dos enredos: por que você também deve ler as análises das obras?

Dicas de Vestibular

25/05/2022 13h32

*Por Henrique Balbi

"E aí, o que acontece depois?" Todo mundo já respondeu a essa pergunta, quando se entusiasma contando a história do livro, filme ou série preferida. Como seres narrativos, nós sentimos uma atração especial pelo enredo, que nos hipnotiza com os eventos e suas consequências, com o destino de personagens e as reviravoltas. Não seria diferente com as obras que caem no vestibular. O problema é pararmos por aí.

Acontece muito: pressionado pelo tempo curto e pela programação longa, o jovem resolve estudar Literatura só pelos resumos da história dos livros. Ou nem isso, se já souber o que acontece ou se a obra trouxer poemas, por exemplo. É uma pena. É como se, depois de apenas uma garfada ou colherada, ele se contentasse com um prato ou sobremesa e já passasse ao próximo.

Toda obra de lista de vestibular está ali porque, no julgamento das bancas, o autor alcançou algum tipo de excelência em sua arte. Excelência que nunca se restringe a um só elemento, como se o livro tivesse ótimos personagens, e mais nada, ou então uma ambientação muito rica, mas linguagem e enredo ruins. Não: grandes artistas como Machado de Assis, Carolina Maria de Jesus, Clarice Lispector ou Graciliano Ramos, entre muitos outros, só atingem esse nível porque trabalham os elementos em conjunto.

Linguagem, tempo, espaço, psicologia das personagens e também o enredo – nas melhores obras, esses elementos são inseparáveis. Assim como todo texto, eles estabelecem uma relação solidária, e não solitária. Angústia, de Graciliano Ramos, mostra uma Maceió tão suja e degradada, num tempo tão opressivo e claustrofóbico, quanto a cabeça de seu protagonista, Luís da Silva. Uma coisa se reflete na outra; elas se fortalecem. O enredo é um dos elementos, não o único. Às vezes nem é o principal.

Uma boa análise enriquece a leitura da obra, mostrando essa relação entre os elementos, conectando o livro a disciplinas surpreendentes, expandindo-o e adensando-o. Entender Quincas Borba, por exemplo, exige que conheçamos o destino de Rubião, antes rico, depois louco e miserável, e como chegou a isso. Mas por que parar aí?

A reflexão sobre o romance, amparada pela análise, vai trazer novas perguntas. Será que Machado não está fazendo uma crítica à elite brasileira? Ou será uma denúncia pessimista do ser humano? É uma sátira ao Segundo Reinado? Uma paródia da ciência arrogante e preconceituosa de seu tempo? Sem entendermos a ironia do narrador, as citações, a matéria histórica ali incorporada, o vai-e-vem moral das personagens, se confiarmos apenas no enredo, nós nem percebemos que Machado faz tudo isso junto, ao mesmo tempo.

Aí se vê outra vantagem de ler a análise das obras: observar a pluralidade de leituras possíveis, para um grande livro. O texto se mantém relativamente igual, mas cada crítico apresenta seu ângulo, explorando alguns pontos, enquanto outros enfatizam aspectos distintos. A obra vai ganhando camadas sedimentares de sentido, sem que a soterrem. Ela é iluminada pelos seus críticos tanto quanto os ilumina – ou mais.

Ler bem uma obra clássica envolve essa capacidade de viajar no tempo, de carona com o autor e através das gerações de críticas, sempre contextualizando e refletindo criticamente. Por isso o vestibular as cobra. É o jeito que ele encontrou de incentivar os estudantes a saberem – e demonstrarem – sua compreensão não só do que aconteceu, mas de como, por quê, com que finalidade e qual foi sua repercussão. Com sorte, responderemos a isso com o mesmo entusiasmo de quando contamos uma história envolvente.

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