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A persistência da escravidão no Brasil

Dicas de Vestibular

16/05/2019 13h07

*Por Raphael Amaral (Tim), professor do Anglo Vestibulares

Nascido em 1820, no atual Benin, de onde foi transportado escravizado ao Brasil, Mahommah Gardo Baquaqua foi uma das milhões de pessoas vitimadas pelo escravismo e pelo tráfico negreiro no século XIX. É sua a única biografia escrita por alguém escravizado na História do Brasil, último país ocidental a considerar crime a escravidão (com a Lei Áurea, em 13 de maio de 1888).

Os relatos de sua biografia testemunham toda a tragédia da desumanização escravista: ser comercializado enquanto mercadoria, sofrer castigos físicos, privações alimentares e desterritorialização, viver em habitações precárias, ser submetido a jornadas de trabalho degradantes e a relações sociais moldadas pela violência do racismo, não ter liberdade e direitos.

Em meio a uma situação tão indigna, o letramento de Baquaqua e a publicação em livro de sua biografia apontam para duas formas de resistência à inferiorização escravista: a preservação da memória e a construção de um legado que rompeu com o silenciamento imposto aos humanos escravizados.

Já no século XXI, uma vez que a escravidão, no momento, continua proibida, ainda é inconstitucional submeter pessoas a condições de trabalho análogas à escravidão. Isso pode ser observado no Código Penal Brasileiro, cujo artigo 149 define como crime "reduzir alguém à condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador", assim como "aliciar, recrutar, transportar, transferir, comprar, alojar ou acolher pessoa, mediante grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso" e submeter seres humanos a qualquer tipo de servidão, adoção ilegal e exploração sexual.

Mesmo assim, segundo o Ministério da Economia, somente entre 2017 e abril de 2019, 2.375 pessoas foram escravizadas. Apesar da predominância em zonas rurais do Norte e Centro-Oeste, as condições de trabalho análogas à escravidão estão presentes em todas as regiões do país, até mesmo em centros urbanos, como em confecções têxteis, comércios e canteiros de obras.

Ainda que o trabalho escravo ocorra em diversas partes do mundo, desde 2017, a Organização Internacional do Trabalho (órgão vinculado à ONU) vem manifestando críticas oficiais especificamente à situação do trabalho no Brasil. A presidência de Michel Temer, em 2017, tentou afrouxar a definição de trabalho escravo, colocando nessa categoria apenas quando ocorre a privação do direito de ir e vir por parte do trabalhador.

Além disso, já em 2019, sob o governo Bolsonaro, agravaram-se as dificuldades de combater o trabalho escravo, seja devido à extinção do Ministério do Trabalho, seja pela aplicação do decreto 9.759, que extingue a Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae), vinculada ao também extinto Ministério dos Direitos Humanos e responsável por monitorar casos de trabalho escravo no Brasil.

Se a biografia de Baquaqua aponta para as crueldades da escravidão no século XIX, a persistência do trabalho escravo no Brasil em 2019 nos faz questionar os reais aprendizados que incorporamos enquanto sociedade acerca desse tema. Por fim, podemos ainda indagar se as mais recentes forças políticas que assumiram o controle do Estado nacional brasileiro estão realmente comprometidas com a erradicação da escravidão no país.

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