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Gerundismo

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11/09/2020 14h10

Por Daniel Fonseca, professor do Anglo Vestibulares 

Eu poderia estar roubando, eu poderia estar matando, mas estou aqui, escrevendo sobre gerundismo.

Antes de mais nada, cumpre esclarecer que gerundismo é o uso inadequado de verbos no gerúndio. No dia a dia, ouvimos frases como: "Você precisa estar pagando um boleto", "eu vou estar ligando para você amanhã". Não seriam mais simples e eficazes as frases "você precisa pagar um boleto" e "eu ligarei para você amanhã"?

O problema não é o gerúndio em si mesmo, mas o exagero, a aplicação desnecessária, a vulgarização. Nada contra essa forma que, inclusive, diferencia-nos um pouco dos portugueses no trato com a língua: aqui, nós estamos falando, vivendo…; lá, via de regra, eles estão a falar, a viver… Ou seja, o gerúndio faz parte do charme brasileiro no uso do idioma e seu emprego se justifica sempre que se quer expressar que uma ação está em curso, está em processo de realização. É o que ocorre nos versos de Chico Buarque: "Muita careta pra engolir a transação/ E a gente tá engolindo cada sapo no caminho/ E a gente vai se amando, que, também, sem um carinho/ Ninguém segura esse rojão". O gerúndio manifesta que, na época, período de ditadura, estavam em curso duas ações, antagônicas: a de amar, para compensar os sapos que se havia de engolir.

Os exames vestibulares estão atentos ao tema, e questão recente da Fuvest pedia para o candidato dizer se havia uso abusivo do gerúndio no aviso: "Sorria, você está sendo filmado". Para responder, precisamos nos perguntar: ao nos depararmos com essa frase, a ação de filmar está em curso? A resposta é sim, é exatamente isso que se procura avisar. Então, não ocorre gerundismo.

Anos antes, a mesma Fuvest propôs análise do verbo "transferindo", no trecho: "O senhor pode estar aguardando na linha, que eu vou estar transferindo a sua ligação". Nesse contexto, a ação de transferir é pontual, não permanecerá em curso. Além disso, a substituição por "vou transferir (ou transferirei) sua ligação" não traria prejuízo algum para o sentido, pelo contrário, seria mais clara e concisa do que o original. Há, portanto, gerundismo nesse outro caso proposto pela banca.

Por fim, talvez o leitor esteja questionando a razão para o início inusitado desta publicação. Não me aborrece nem envergonha escrever sobre nossa língua. No entanto, é tão comum que a discussão sobre gerundismo incite comentários depreciativos contra as pessoas que dele se valem, que hesitei em escrever um texto de caráter prescritivo sobre o tema. Por um instante, tive a sensação de tomar parte nessa baixeza. Mas foi só por um instante: a discussão sobre a norma-padrão não pode pagar pelos tolos, que dela se valem para humilhar.

Sobre os Autores

O Dicas de Vestibular é produzido e atualizado pelos professores do Anglo Vestibulares e do Sistema Anglo de Ensino.

Sobre o Blog

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